A gente sabe que vendedores tem uma má reputação.

A imagem da pessoa que está disposta a cometer pequenos deslizes éticos para vender já faz parte da fantasia coletiva.

Essa visão não vem de agora, e provavelmente se a profissão de vendedor surgisse hoje, seria muito difícil que o estigma fosse o mesmo.

Theotore Leviit, Professor da Harvard Business School em seu artigo mundialmente famoso, publicado em 1960, “Miopia de Marketing“, traz uma citação que nos ajuda a entender porque, no passado, vendedores ganharam a fama de mentirosos.

O vendedor não enxerga todo o processo do negócio como consistindo em um esforço totalmente integrado para descobrir, criar, despertar e satisfazer as necessidades do cliente. O cliente é alguém “lá fora” que, com a técnica adequada, pode ser separado do seu dinheiro.

Segundo o professor Levitt, a parte das vendas não compreende o impacto do todo no negócio, tentando apenas empurrar a venda sem considerar as consequências no ciclo de vida da empresa.

Talvez numa época onde os produtos duravam quase que por toda vida e você dificilmente faria negócio com um cliente duas vezes, essa visão até pudesse funcionar. Só que a gente sabe que as vendas mudaram e, em 2018, não é bem assim que a banda toca.

Um cliente nunca deixa de ser cliente

Seja você vendedor de uma loja de materiais e equipamentos para piscina, ou gerente comercial de uma grande empresa de tecnologia, a ideia de que, após a venda, o cliente sai pela porta e não volta mais, precisa ser desconstruída imediatamente.

Dificilmente um cliente tem apenas uma necessidade. No caso da loja para equipamentos de piscina, é quase certo que precise de algum outro material com certa regularidade. Já nas empresas de tecnologia, é normal que precise de um upgrade de plano ou algum módulo extra.

Mentir para alguém que tem grande potencial de comprar novamente é uma estratégia muito ruim e que pode garantir a primeira venda, mas assim que o cliente se der conta que foi enganado, ele não volta mais.

É mais fácil – e baratovender para um cliente que já comprou uma vez, do que buscar novos clientes para cada venda.

Mentir é o melhor marketing para a concorrência

Não existe marketing melhor para a concorrência do que uma venda ruim. A experiência traumática não apenas amplifica a sensação de arrependimento, como gera uma onda de indicações negativas. O famoso “Olha, comprei lá e não gostei, acho que você deveria olhar nesse outro lugar aqui”.

Esse é um tipo de conversa que amigos costumam ter em bares e eventos sociais, trocando experiências sobre o que valeu ou não a pena. Mais ainda, em casos graves, existem grandes serviços online que estampam a má qualidade por toda internet, como é o caso do Reclame Aqui.

Ao mentir para empurrar uma venda, o vendedor não está só perdendo um possível cliente recorrente, mas criando um espectro de propaganda negativa que afasta possíveis novos interessados.

Venda empurrada tem custo alto

João queria contratar um sistema de gestão para sua empresa, passou semanas pesquisando e analisando concorrentes. Durante uma conversa por telefone com o vendedor, nosso personagem deixou claro que algumas funcionalidades eram cruciais para seu negócio.

O vendedor desconversou, disse que dava pra fazer e seguiu com a venda.

Com a aquisição concluída, João decide começar a implantação do sistema e utilizar as funcionalidades que precisa. Quando não encontra, entra em contato com o suporte para pedir ajuda. O suporte, por sua vez, não entende muito bem o que o cliente fala, e precisa conversar com o vendedor e o desenvolvimento para saber se não está deixando passar algo.

Dizer para um cliente depois que fechou negócio que a funcionalidade que ele queria não existe pode ser fatal.

Este processo de vai e vem demora horas, muitas vezes dias. O suporte acaba sendo onerado e muitas vezes a equipe de desenvolvimento também, tentando criar alguma gambiarra para não perder o negócio. O normal é que o desgaste tenha alguns custos altos para a empresa: as horas do suporte, as horas de desenvolvimento, o aumento no tempo de resposta do suporte e, depois que o cliente se arrepender e desistir da compra, a perda do valor investido na aquisição de cliente.

O cliente vindo de uma promessa falsa tem um custo operacional muito alto, muitas vezes não compensando para a empresa e deixando prejuízos. A meta alcançada no fim do mês acaba não valendo de nada.

O vendedor inteligente entende que o ciclo de uma venda vai muito além do fechamento, e mentir durante uma venda prejudica os negócios em vários aspectos que na maioria das vezes podem sair do controle.

Uma propaganda ruim vinda de um cliente insatisfeito pode trazer danos reais, e os custos, como pudemos ver, vão bem além de um simples negócio. Por mais tentador que seja dobrar um cliente na argumentação, existe um momento onde o vendedor precisa colocar a mão na consciência e pensar:

Vale a pena trazer essa dor de cabeça em troca de uma única venda?