Eu normalmente não compro produtos de vendedores ambulantes. No geral as técnicas de venda por pressão social ou apelo à consciência moral não funcionam comigo. Por escrever e estudar argumentação de vendas faz alguns anos, é bem transparente quando alguém chega com uma abordagem dessas.

Mas na última semana eu cai em outro tipo de abordagem, mas que nunca tinha visto em vendedores de rua. Suspeito que alguém esteja treinando os jovens que vendem produtos na praia em Maceió, em uma semana eu recebi abordagens parecidas umas 3 vezes.

Gravei um vídeo com o pitch de uma criança de 13 anos, e que durou exatos 39 segundos. O que surpreende é que o discurso é recheado de técnicas combinadas, e apesar de curto, é muito bem estruturado.

É importante também dizer que este texto não tem objetivo de enaltecer o trabalho infantil, apenas observar como a estrutura de um discurso muito bem organizado funciona.

Não vou usar o vídeo por ser uma criança menor de idade, mas vou transcrever a abordagem para explicar a estrutura.

Licença, boa tarde? Posso falar rapidinho se não for atrapalhar vocês?
Tudo bom?

Cumprimentou eu e minha esposa: Ao falar comigo, a vendedora deu um casual tapinha na mão com soquinho no final, depois apertou a mão da minha esposa.

É que meu nome é Carolina, eu tenho 13 anos e vendo Torteletes, que é uma sobremesa super gostosa, que não engorda e é super baratinho.

É para ajudar a comprar o que falta do meu material e ajudar minha mãe. E são 1 ou 2, se vocês puderem eu troco se não tiverem trocado, e se não quiserem comer agora e estiverem muito cheios, não tem problema, tem sacolinha para embrulhar e levam para comer depois.

Aproveitando que ela é gostosa, está na promoção e hoje é quase meu último dia, leva pelo menos 1 ou 2 que é baratinho e tá na promoção.

O rapport mais rápido do mundo

Ao cumprimentar eu e minha esposa, a vendedora de doces nitidamente personalizou os cumprimentos para engajar diferente com cada uma das pessoas que estava presente. Eu que estava de boné e tenho tatuagens, recebi um cumprimento casual, igual meus amigos usam. Minha esposa que tem uma expressão mais séria, ganhou um aperto de mão tradicional.

Conquiste mais leads

Como falta tempo para estabelecer um rapport bem trabalhado, a melhor saída para gerar essa conexão é na hora do primeiro cumprimento. Com a vendedora personalizando o cumprimento, eu entendi que ela me viu diferente e minha esposa entendeu o mesmo.

Foi um gesto simples, mas o suficiente para nos identificarmos com apenas um gesto e criar a conexão.

O cenário define a velocidade e tamanho do discurso

Eu estava na praia, no meio da tarde e curtindo minhas férias. Qualquer discurso longo demais me levaria a interrompê-la e dizer que não estava interessado. Mas a jovem falava direto, sem enrolar, com uma boa dicção e sem gaguejar.

O engraçado dessa história é que me remete bastante ao conto do Pitch de Elevador e da ideia de ter um Pitch rápido e pronto para quando tiver pouco tempo. No caso do elevador é um pouco de exagero, mas para quem está interrompendo turistas na praia, ter uma boa cadência na fala e um tempo de abordagem curto, mas eficiente ajuda muito.

Quem eu sou e do que estou falando

O argumento abre rápido e objetivo. Ela se apresenta, deixando de ser uma pessoa desconhecida e se torna um nome, alguém que é possível conectar. Em seguida explica o que está vendendo e cita 3 características positivas.

  • Super gostosa: desperta interesse
  • Não engorda: elimina um medo
  • É baratinho: define acessibilidade

Em apenas uma linha, a vendedora criou proximidade, despertou meu interesse, me tirou o medo comum de quem come doces, ainda fechou mostrando que eu posso ter o produto, já que preço não é o problema.

Hora da história

Uma habilidade de vendedores experientes é a capacidade mesclar diversas técnicas para não tornar a abordagem previsível ou clichê. Alguém que se apoia apenas no storytelling, por exemplo, corre risco de ser rejeitado logo de começo: “mais uma pessoa me contando historinha”.

É para ajudar a comprar o que falta do meu material e ajudar minha mãe.

Neste caso, o storytelling surge rapidamente em meio a várias outras técnicas. E o argumento não é apenas para me convencer a comprar, mas também ativa um gatilho mental: o gatilho da justificativa.

Segundo alguns experimentos, as pessoas estão mais dispostas a confiar no que você diz quando você dá uma justificativa para aquela ação.

Agora que eu entendo as motivações da vendedora, é mais fácil confiar no que ela diz e sentir que posso ajudar. Tudo isso feito em apenas 15 palavras.

Rebatendo objeções mais comuns

No trecho seguinte, Carolina me diz o preço da mercadoria, mas antes que eu conseguisse esboçar alguma reação, ela já cobriu as objeções mais comuns.

São elas:

  • Se não tiverem trocado, eu troco para vocês.
  • Se não quiserem comer na hora, ela pode embrulhar para viagem.

Essas respostas rebatem as óbvias desculpas que usamos para não comprar comida de ambulantes:

  • Tô sem trocado
  • Acabei de comer, to satisfeito

Um bom call to action para fechar

Agora que no pitch de 39 segundos da jovem vendedora já fizemos conexões, entendemos motivações e tivemos nossas objeções rebatidas. O que falta é só uma boa chamada para eu tirar meu dinheiro do bolso e saborear aquele doce.

Aproveitando que ela é gostosa, está na promoção e hoje é quase meu último dia. Leva pelo menos 1 ou 2 que é baratinho e tá na promoção.

Aqui um CTA curto mas muito bem estruturado cai como uma luva.

Veja a estrutura:

  • De onde veio meu interesse: é gostosa
  • Ativa o gatilho de urgência: está em promoção e é quase meu último dia
  • Diz para eu levar agora e reforça que o custo é baixo: Leva pelo menos 1 ou 2 que é baratinho e tá na promoção

É interessante notar que até as repetições das palavras, que poderiam fazer um texto perder sua força, aqui funcionam como um reforço do argumento. Como leitura podem até soar estranhas, mas ouvindo passa com naturalidade e fixa a ideia: ”está em promoção.”

A estrutura funciona bem e pode ser replicada

Como mencionei no começo, essa não foi a única vez que um vendedor bem jovem que me abordou com uma estrutura bem similar. O que mudava era o storytelling, as objeções e qualidades que definiam o produto.

Por isso acho que alguém está treinando essas crianças. Apesar de acreditar que pode ser apenas fruto da observação e cópia, assistindo como outras pessoas vendem, a estrutura é muito organizada com elementos bem contundentes.

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